O que na vida não pode ser medido?
- Horácio Amici
- 5 de mai. de 2019
- 2 min de leitura
Hoje em dia, é muito fácil conseguir quantificar tudo, de forma bastante eficiente: nossas transações bancárias, a quantidade de carboidratos que comemos, quanto tempo vamos levar para chegar até o nosso destino.
Tudo começa a se encaixar em uma lógica previsível e controlada: a nossa forma de viver exige que muitos aspectos da nossa vida tenham esse contorno para que as coisas transcorram no ritmo que agora elas têm.
Tudo começa a parar de fazer tanto sentido, penso, quando começamos a transferir essa lógica para todos os campos da nossa vida: nossos afetos passam pelo crivo dos likes, nosso sofrimento pelas escalas psiquiátricas de depressão, a vida mesma passa a ser encarada em termos de consumo e produção.
No campo da nutrição, por exemplo, discute-se muito a questão da medicalização da alimentação. A alimentação, que contempla em si aspectos afetivos, sociais, identitários, passa a ser encarada apenas em relação à sua faceta biológica: dietas restritivas ganham campo, tudo o que comemos (ou melhor, ingerimos) deve seguir um rigor cartesiano.
Queremos saber a melhor (e mais eficiente) forma de educar nossos filhos e filhas, fazer os exames mais aprofundados para nos prevenir de possíveis doenças futuras, ter o final de semana o mais intenso possível e, ao mesmo tempo, descansar o máximo possível.
A vida, que também é campo do imprevisível, do desconhecido (e até do absurdo, muitas vezes) não pode se mostrar senão que de forma passível de ser predita, tratada. Domesticada.
No lugar de que entra essa nossa necessidade incessante de tudo saber, de tudo precisar quantificar e prever? O que a gente busca sanar com essa ânsia por saber? É desejo de controle? É desejo de justamente me proteger da minha impossibilidade de saber o que, de fato, eu desejo?
O saber entra no lugar de que falta? Na falta daquilo que não posso saber sobre mim mesmo? Na ausência que se construiu em mim justamente por eu não ter dado espaço para todo o resto que era vida em mim e que não pôde ser?

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